Hoje a manhã surgiu rosada pela janela, um tanto incomum aos habituais raios de sol alaranjados depois de tantas madrugadas. Quando criança, imaginava um castelo sobre as nuvens, até planejei pegar um de seus tijolos assim que eu tivesse a oportunidade de viajar num avião. É de se pensar. Pois, com o passar dos anos, a água em seu estado gasoso dissipara a imaginação duma criança para uma realidade acinzentada e concreta.
É com uma coleção de memórias que vejo Pearl Jam. Quando eu decidi escutar Rock, deparei-me com uma lista dos dez melhores álbuns dos anos 1990 e, após analisar as boas indicações, escolhi ouvir Eddie Vedder e seus companheiros. Dediquei-me a escutar tudo que a banda havia lançado até então, embora “dedicar” não seja a palavra exata, porque, na verdade, eu me “forcei” a gostar não só da banda como do estilo em si. Eram tempos turbulentos na minha juventude.
Eu não entendia o porquê de tantos elogios, então passei a comprar as mais variadas revistas sobre música; a princípio não ajudavam, mas com o passar do tempo eu via finalmente a arquitetura daquele labirinto em que me meti. Agora, olhando para trás, sinto que fora um bom tempo perdido. Lembro até da entrevista que Vedder cedeu, transmitida pela extinta MTV Brasil, onde falava que “toda discografia tinha seus altos e baixos” – na época do lançamento do disco “Yield”.
Mas estamos no presente momento, presente esse em que “Gigaton” é mais um alto no repertório de Pearl Jam. Os acontecimentos de 2020 geraram impacto nas letras num tom pessimista em sua maior parte. Diferente de seus trabalhos anteriores, a banda se permitiu explorar suas fragilidades e incertezas. Também diferente do que alguns esperavam, algo mais “visceral e inovador”, já que Pearl Jam segue em ótima forma; “Gigaton” reflete perfeitamente um ano, no mínimo, desolador e frustrante. Talvez seja este o problema, a realidade sorrateira nos privou de enxergar o castelo sobre as nuvens.
P.S.: Para quem não se atrai pela “barulheira” habitual, indico buscarem as baladas dessa banda, pois nunca decepcionam. Para quem quer começar, indico o álbum ao vivo “Let’s Play Two” (2017), uma vez que Pearl Jam consegue ser ainda melhor ao vivo.