Sabe o que eu detesto atualmente? Eurocentrismo. Sim, aquela noção arcaica de que a música de verdade consiste apenas nas obras de grandes compositores europeus. Aquela pompa de música clássica e orquestras executando as peças mais complexas que se possa imaginar. Obviamente muitos já questionaram a completa ausência dos outros continentes quando se estuda música erudita, engraçado, não é? Por algum motivo escuso (eugenia) e muitos saqueamentos ao longo de umas centenas de anos, o que era nosso deixou de ser. Ora, música é identidade e nossa identidade passou a valer menos. Tenham isso em mente.
É bastante irritante ler críticas de profissionais que se baseiam justamente nessa escola. Pois o erudito segue o padrão rígido e engessado, complexo demais e regras imutáveis. Agora pergunto-lhes: para quê? É uma disputa para ver quem faz música melhor, dentre tantos países com suas respectivas culturas e gêneros musicais? Não, não é. Isso acontece para assegurar e reforçar a noção de um abstrato superior. O samba, por exemplo, era considerado “barulho de batuques primitivos” e ilegal até um grupo da tal alta sociedade decidir que era música.
Mas essa maldita noção nunca vai embora. Principalmente quando se trata de música eletrônica que, mesmo replicando perfeitamente quaisquer instrumentos, (silêncio) não há banda, não há marcha e portanto não há música. Funk carioca vale menos. Pior ainda, se traçarmos uma linha temporal de eventos, dá para notar uma constante no valor da música: o fato de não ser a música em si, e sim de quais grupos sócio étnicos ela vem. Como estamos vivenciando hoje um movimento de transgressão em todas as áreas artísticas, é possível ouvir os esqueletos cultos chacoalharem raivosos em seus túmulos – e seus discípulos, mais ainda.
Então, como Pixy entra nisso tudo? Ora, por ter todos os elementos necessários para irritar os puristas; das maiores até as menores escalas e métricas dos acordes sem fim. Não vou negar, eu estou sentindo uma felicidade imensa ao escrever neste momento, pois é simplesmente hilário ler críticas de profissionais que nunca ouviram Bass music na vida, resumindo tudo a meras “batidas de panelas e ruídos”. Lembram que pedi para guardarem a questão da identidade? Pois bem, tenham cuidado com quem está decidindo se determinada música ou gênero presta ou não. Quanto ao EP “Fairy forest: Bravery”, temos um excelente resultado. Destaco todas as faixas. Aproveitem!
Reflexão maravilhosa!!!
E também muito necessária, porque música é arte, e arte depende principalmente da conexão que a obra estabelece com quem a está apreciando. Não quero desmerecer críticos de arte, porque eles ajudam a entender contextos, técnicas e afins, mas existe esse hábito problemático de quem quer ditar que determinado estilo é superior a outro estilo.
Vimos isso recentemente no caso da crítica do Rick Bonadio ao uso do funk em parte da apresentação da Megan Thee Stallion no Grammy, por exemplo. E o curioso é ver que há muita hipocrisia nos argumentos que são frequentemente usados pra justificar que um gênero é superior a outro – vemos isso bastante em fãs de rock criticando as letras e coreografias sexualizadas em músicas de funk e pop, sendo que vários dos grandes sucessos de rock têm MUITO MAIS conteúdo sexual…
Tudo isso dito… sejam bem vindas, Pixy! A julgar por esse single, vocês já começaram bem!
Exatamente. A argumentação deles sempre vai cair no contraditório. Dar carteirada com gênero musical é de praxe. Mas não dá pra ignorar o contexto cultural, simplesmente não dá.
Eu me surpreendi muito com Pixy, esse EP está muito bem produzido (e até tem o remix de rock/metal da faixa “Wings” pra ver se o choro diminui hahahaha). Elas são muito carismáticas e já vieram com um excelente EP. São muito bem-vindas, mesmo!